Ao
ler “Bartleby, o escrivão”, o leitor fica curioso em saber mais
do personagem tão excêntrico. A história é narrada por um
advogado, dono de um escritório, que começa a explicar como
conheceu Bartleby. Primeiro apresenta seus funcionários e suas
manias peculiares, pois Nippers pela parte da manhã tem um
temperamento efusivo, mas a tarde fica gentil; e Turkey agia de modo
semelhante, mas ao contrário: pela manhã era cortês e gentil, e à
tarde era, como o próprio narrador o descreve, insolente. Mas o que
o levaria a continuar empregando esses homens tão estranhos? Podemos
julgar o caráter dele pelo modo que trata Bartleby. É um homem
paciente, e que gosta de ver o lado positivo e lucrativo das coisas.
O terceiro empregado é um menino, aparentemente normal. Mas quando
conhece Bartleby, a história beira o absurdo. Não sabemos o seu
nome, só que era advoga e idoso quando começou a contar quem era
Bartleby.
“Preferia
não fazê-lo” é uma frase que será repetida várias vezes, e que
fará parte do vocabulário dos homens daquele escritório. Um homem
calado, quieto, que cumpria o seu ofício diligentemente, mas apático
obstinado: esse era Bartleby. Ao receber ordens do seu empregador,
Bartleby simplesmente dizia: prefiro não fazê-lo. Quando recebeu
essa resposta desconcertante pela primeira vez, o advogado fica
nervoso e sem saber o que fazer. Como assim preferia não fazê-lo?
Ao ser indagado por ter uma atitude tão fora do comum, ele permanece
calado. Mas Bartleby não dizia isso para embaraçar ou ver o seu
chefe numa saia justa. Simplesmente preferia não fazê-lo, essa era
a sua resolução. Que homem teria coragem de agir assim com o seu
patrão? Ele era uma figura que não causava qualquer tipo de
repulsa, mas sim um sentimento de compaixão. Quem seria aquele
homem, que pouco comia, mal saía do escritório – quase nunca saía
–, e que cumpria o seu trabalho de forma tão exemplar? Como um
homem desses poderia ser, ao mesmo tempo, tão obstinado a não
preferir fazer algo que o homem que pagava o seu salário lhe pedia
para fazer – algo que ele, na posição de empregado, deveria
fazer?
Não
temos respostas para essas perguntas, mas toda a situação fica
ainda mais absurda quando Bartleby se recusa a sair do escritório.
Ao ser mandado embora, diz que não prefere ir embora. O advogado
chega a perder a cabeça, mas logo se recompõe – pois o que sente
por aquela criatura, tão sozinha e apática, era que deveria amá-lo
apesar da sua aparente loucura. Como o narrador mesmo diz, se não se
lembrasse do mandamento de que devemos amar ao próximo como a nós
mesmos, teria cometido um assassinato. E essa é a melhor frase do
livro:
A
caridade muitas vezes funciona como um princípio sábio e prudente,
constituindo uma poderosa salvaguarda para o seu possuidor. Os homens
já cometeram assassinatos por ciúme, raiva, ódio, egoísmo e
orgulho espiritual; mas jamais ouvi falar de homem que tenha cometido
assassinato por caridade. (pp. 67-68)
A
narrativa de Melville deixa abertura para muitas interpretações,
das quais nunca chegaremos à correta. O leitor fica aturdido com
tamanho absurdo, mas ao mesmo tempo pode ter compaixão e achar algo
semelhante à misericórdia. O que faríamos se contratássemos um
Bartleby? Teríamos a mesma paciência e bondade do narrador? Quem
seria Bartleby? Qual a sua história, e o porque ele agiu do jeito
que agiu? São perguntas que ficarão sem respostas, pois é isso que
uma grande obra – mesmo que curta – faz. Deixar o leitor procurar
as respostas que nunca encontrarão, despertando a imaginação de
cada um. (Com prefácio de Jorge Luis Borges, maravilhoso).
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