Ambientado em uma
Inglaterra medieval e fantástica, habitada por ogros, duendes, cavaleiros e uma
dragoa, Ishiguro conta a história de Axl e Beatrice, um casal de idosos que sai
em uma jornada até a aldeia de seu filho. Tanto bretões como saxões são
afetados por uma névoa que apaga o passado da memória de todos. Quase ninguém se
dá conta de que suas memórias são apagadas dia após dia, e o casal, talvez,
sejam os únicos na aldeia que percebem o que de fato está acontecendo. Axl ama a
sua mulher, e a chama carinhosamente de princesa. Mas um sentimento forte e
rancoroso quer despertar e isso possivelmente abalará a vida dos dois. O mesmo
acontece com Beatrice, mulher gentil e preocupada com o homem com quem está
casada. Os dois se lembram de uma discussão que tiveram, após Beatrice sugerir
que eles fossem visitar a aldeia do filho. Axl não recorda desse tal filho e
pergunta-se se de fato esse filho existe. Essa névoa do esquecimento afeta de
forma sutil mas cruel a todos que, mesmo quando começam a lembrar-se de algo do
passado, no mesmo instante pensam na possibilidade de estarem fantasiando. Mas,
após uma conversa onde o casal vai costurando o passado com pedaços fragmentados,
decidem-se a viajar até a aldeia do filho, que, aparentemente, não sabem onde
fica.
É muito esquisito mesmo como o mundo está esquecendo das pessoas e de coisas que aconteceram ontem ou anteontem. É como se uma doença tivesse contagiado a todos nós.
A fantasia apresenta-se
de forma sutil, e é muito compreensível que seja assim. Não convém exigir ações
frenéticas com elementos fantásticos entrando em cena a cada parágrafo, em uma narrativa onde o assunto principal
seja a perda da memória, o que o passado pode revelar e como ele pode destruir
a ordem das coisas e como ele põe o amor que uma pessoa sente por outra em
dúvida. Até chegar à aldeia do filho, o casal de bretões param em uma aldeia saxã
onde todos estão perturbados com a notícia de que ogros demoníacos raptaram uma
criança. Axl e Beatrice conhecem o valente guerreiro saxão que libertou a
criança da prisão dos ogros, o misterioso Wistan. O saxão acompanha os velhos,
pois o menino Edwin que havia sido salvo por ele agora corria risco de morte na
aldeia onde vivia, e juntos continuam a jornada que trará revelações
assustadoras sobre os padres que viviam em uma antiga fortaleza e o terrível
embate de um contra vários. Além do menino e do guerreiro, o cavaleiro sobrinho
de Arthur, Sir Gawain, os protege de males futuros, como o perigo que enfrentam
em um túnel subterrâneo ao fugirem dos homens do lorde Brennus.
Ishiguro segurando seu livro. |
Quando sai da aldeia, o
passado vem de forma desconexa à mente de Axl, e este começa a ter uma ideia do
que pode ter acontecido no passado e o mesmo acontece com Beatrice. Não sabemos
ao certo se as lembranças dos personagens sobre o seu passado é de fato
verdadeira, pois como podemos confiar se eles são afetados pela névoa do
esquecimento? Mas conforme a narrativa prossegue, podemos ter alguma ideia
sobre o passado deles. As divagações também são um empecilho para descobrirmos
quem são aqueles velhos bretões e o que de tão assombroso aconteceu com eles. Wistan
é um homem misterioso e, todas as vezes que conta algo de sua vida, nunca é de
forma concreta. Ele solta uma coisa aqui e outra ali, mas sem revelar o real
motivo dele estar tão longe de sua terra saxã. Também desconhece o que causa a
névoa, mas logo sabemos que se trata de um blefe. Apesar de ter simpatia pelo
casal bretão, jura ódio a todos os bretões. Sua missão, revelada no final do
livro, é cruel para todos.
★★★★ |
Deve ser efeito dessa névoa. Tem muitas coisas que não me importo nem um pouco que se percam na névoa, mas é cruel quando não conseguimos nos lembrar de algo precioso assim.
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