Pular para o conteúdo principal

Com desfecho previsível e clichê, "À primeira luz da manhã" não consegue sustentar o ritmo da história


Quem olhar para a minha estante vai perceber um grande número de romances ambientados no período da Segunda Guerra Mundial. Não só romances ambientados, mas também livros de não ficção sobre este período obscuro da nossa História. “À primeira luz da manhã”, de Virginia Baily, é um desses romances do qual falei. Ambientado na Itália ocupada pelos Nazistas, a história é um pouco confusa. A premissa é interessante, mas o desenrolar da trama não funciona. Cogitei várias vezes em abandonar a leitura e escrever uma resenha sobre as primeiras cem páginas que tinha suportado ler. Não que a escrita seja maçante, mas a forma como decidiu estruturar o romance é que torna a leitura enfadonha. Explico. Baily escreve sobre Chiara Ravello e Daniel Levi, um garotinho judeu que foi entregue a Chiara pela sua mãe, com muitas súplicas, para que o menininho não tivesse o destino do restante da família: ser enviado a algum campo de trabalho forçada na Alemanha. A protagonista aceita a sua missão, mesmo hesitante, e salva o menino. Só que a relação dos dois estanca ali mesmo e ela faz de tudo para que Levi se abra para ela e comece a viver uma nova vida. Indo do passado para o presente, onde Chiara não vê mais seu ‘filho’ há alguns anos e isto a tortura – além da descoberta de que Levi tinha uma filha – a autora deixa os leitores confusos. Não se trata de um capítulo para a situação atual e outro para o passado de Chiara, mas sim os capítulos se misturam e não há essa estruturação ‘certinha’.

Os detalhes históricos são bem fiéis, e Baily faz com que os leitores se transportem para aquele período. O drama de Chiara é elevado ao máximo, e repassado à exaustão. Não há solução para essa tensão entre o garoto e a signora e infelizmente isto não é tão aprofundado, já que é a mola de impulso para toda a história. Gostaria de ler sobre a relação dos dois quando o garoto começou a se envolver com drogas, mas temos apenas alguns detalhes desse período. Chiara é a única personagem bem estruturada, já que Daniele Levi permanece uma incógnita para os leitores. Mais uma vez, se Baily tivesse criado o personagem de Levi com mais intensidade e explorado a tristeza que o garoto carregou durante a vida até chegar ao ponto de querer desperdiçá-la usando drogas, a história ganharia um novo fôlego. Mas não. A sensação é de um loop cansativo, para frente e para trás, não avançando para lugar nenhum. Até o desfecho é aguado, previsível e clichê. Infelizmente a trama acaba enfraquecendo ao passar das páginas e resta ao leitor prosseguir sem ânimo algum.

“À primeira luz da manhã” é o segundo romance de Virginia Baily. Em 2012 ganhou o McKitterick da Society of Authors pelo seu primeiro livro, “Africa Junction”.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Leia o conto "O Gato Preto", de Edgar Allan Poe

Não espero nem peço que acreditem nesta narrativa ao mesmo tempo estranha e despretensiosa que estou a ponto de escrever. Seria realmente doido se esperasse, neste caso em que até mesmo meus sentidos rejeitaram a própria evidência. Todavia, não sou louco e certamente não sonhei o que vou narrar. Mas amanhã morrerei e quero hoje aliviar minha alma. Meu propósito imediato é o de colocar diante do mundo, simplesmente, sucintamente e sem comentários, uma série de eventos nada mais do que domésticos. Através de suas consequências, esses acontecimentos me terrificaram, torturaram e destruíram. Entretanto, não tentarei explicá- los nem justificá-los. Para mim significaram apenas Horror, para muitos parecerão menos terríveis do que góticos ou grotescos. Mais tarde, talvez, algum intelecto surgirá para reduzir minhas fantasmagorias a lugares-comuns – alguma inteligência mais calma, mais lógica, muito menos excitável que a minha; e esta perceberá, nas circunstâncias que descrevo com espanto...

O Cavalo e seu Menino, de C. S. Lewis

O terceiro livro de As Crônicas de Nárnia em ordem cronológica, O Cavalo e seu Menino, narra a história de duas crianças fugindo em dois cavalos falantes. Shasta vive em uma aldeia de pescadores e vive como se fosse um empregado do seu pai ‘adotivo’, Arriche. Quando um tarcãa chega à aldeia e pede para se hospedar na casa de Arriche, este aceita sem hesitar. Com um hóspede nobre, o pescador coloca Shasta para dormir no estábulo junto com o burro de carga, tendo como comida apenas um naco de pão. Arriche não era um pai afetivo, acho que ele nem se considerava pai do menino. Via mesmo ali uma oportunidade de ganhar mais dinheiro, e quando o tarcãa oferece uma quantia por Shasta, ele ver que pode arrancar um bom dinheiro com a venda do menino e assim começam a barganhar um preço pelo garoto. Ao ouvir que o seu ‘pai’ iria lhe vender, o menino decide fugir e ir para o Norte — era o seu grande sonho conhecer o Norte. Ao se dirigir ao cavalo, e sem esperar nada, desejar que o animal fa...

A batalha espiritual em "Este Mundo Tenebroso", de Frank Peretti

Uma narrativa empolgante, original, sem muito clichê, eletrizante e até mesmo de arrepiar.    Em Este Mundo Tenebroso, a cidade de Ashton está sendo alvo de um grande plano. Forças malignas querem tomar a cidade para si no reino espiritual, e uma sociedade secreta, a Sociedade da Percepção Universal, quer que a calma cidade americana seja mais uma de suas propriedades. Frank Peretti conduz a história de forma muito fluida, sem fazer o leitor se perder na narrativa. Ora, temos aqui duas ações: a física e a espiritual. No plano físico, Hank Busche, um homem de oração, sente que algo está acontecendo com a sua cidade. Por ser uma pedra de tropeço, Alf Brummel, o delegado de Ashton e membro da igreja onde Hank pastoreia, faz de tudo para que o temente homem de Deus seja expulso do cargo e da cidade. Já Marshal Hogan, um jornalista que comprou o Clarim, um pequeno jornal de Ashton, descobre muitas coisas que não eram para serem descobertas. Os dois são alvos de Alexander M...